Por Yuri Scardini
Há duas semanas, houve uma reunião a portas fechadas, fora da agenda oficial, entre o governador Renato Casagrande (PSB) e o presidente da Câmara Municipal, Rodrigo Caldeira (Rede). O fato causou surpresa no meio político serrano, uma vez que o município vive uma grave crise institucional entre o prefeito da Serra, Audifax Barcelos (Rede), e vereadores de oposição, liderados por Caldeira.
Perguntado sobre a reunião, Casagrande não quis falar pessoalmente e escalou a assessoria para blindá-lo. Esta, por sua vez, respondeu sem de fato esclarecer as dúvidas levantadas pelo Tempo Novo. Afirmou que Caldeira apareceu fortuitamente no Palácio Anchieta e Casagrande o atendeu, pois estaria com tempo disponível. A informação por si só já causa espanto.
Já sobre a pauta da reunião, o governador afirmou que era para tratar de investimentos na Serra, mas sequer detalhou o assunto. Segundo informações de bastidores, outra reunião (dessa vez com mais vereadores) estaria para ocorrer a qualquer momento.
Não dá para negar que Casagrande já se envolveu nesse cabo de força político que se instalou na Serra. Mas por quais motivos um governador entraria numa briga local, repleta de acusações gravíssimas e com bastidores tão perversos?
No primeiro olhar, a resposta mais superficial à pergunta é: derrubar Audifax transformará a vice, Márcia Lamas, em prefeita da Serra; e, é claro, ela é do PSB, e pode dar sustentação política à futura candidatura do filho, o secretário de Casagrande Bruno Lamas.
É um raciocínio linear, mas não combina com o perfil de Casagrande e, segundo informações do QG dos Lamas, eles próprios andam meio divididos com esse papo de derrubar Audifax.
Estamos em 2020 ou em 2022?
Mas talvez Casagrande tenha outros pontos de vista. Ele é governador pela segunda vez, está na vanguarda da leitura de realidade. Será que ele não estaria se antecipando para 2022?
Vale lembrar que, no próximo dia 7 (terça-feira), o Tribunal de Contas (TC-ES) vai julgar as contas de Audifax referentes ao exercício de 2016. O documento que será apreciado pelos conselheiros é a Instrução Técnica Conclusiva de nº 02296/2018-3, que recomenda ao TC-ES enviar um parecer à Câmara da Serra orientando a rejeição das contas de Audifax.
Segundo a pauta publicada no site do Tribunal, a relatoria do processo (nº 05186/2017-1) caiu exatamente nas mãos de Luiz Carlos Ciciliotti, ex-presidente estadual do PSB – partido de Casagrande – e nomeado pelo mesmo em fevereiro desse ano para ocupar a vaga de Conselheiro do órgão de contas.
Caso o TC-ES mantenha a orientação pela rejeição das contas de Audifax, o documento será encaminhado à Câmara para apreciação dos vereadores. Lá, entre 23 parlamentares, são 16 oposicionistas que dominam a Mesa Diretora e as principais comissões internas.
A previsão é que a tramitação do documento galope pela pauta legislativa, confirmando a rejeição e, consequentemente, deixando Audifax inelegível por oito anos, tirando-o sumariamente da disputa para governador em 2022.
Além desse flanco, tem as contas de 2013 e 2014 que tramitam no Legislativo Municipal. Apesar de o Tribunal de Contas orientar pela aprovação nos dois casos, o momento político da Serra está tão friccionado que não se pode descartar a hipótese de os vereadores ignorarem o parecer técnico e votarem pela rejeição.
Futuro da Câmara de Vereadores
Politicamente, Audifax está num contexto de formação de um novo grupo político no Espírito Santo paralelo à Casagrande e que tem o presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso (PRB), e o deputado federal Amaro Neto (PRB). Esse grupo tem DNA remanescente do ex-governador Paulo Hartung, adversário político de Casagrande.
Esse movimento de oposição que quer cassar o prefeito já desgasta a todos os envolvidos, uma vez que a população não irá separar “alho de bugalho”. Além disso, são grandes as chances de ninguém obter êxito: nem Audifax suprimir a oposição em totalidade nem os parlamentares conseguirem cassá-lo.
Enquanto isso, o exército de 500 futuros candidatos a vereador anda por aí apostando numa onda de renovação. Alguns já se perguntam pela cidade se a Câmara não estaria servindo como “boi de piranha” para atender a outros interesses ainda maiores.