Bruno Lyra
O projeto de lei de autoria do executivo protocolado na Câmara, no último dia 21 de fevereiro, para proibir descarte de rejeitos da Vale na Serra é justa reação da cidade. A notícia de que uma pedreira abandonada aos pés do Mestre Álvaro seria usada para jogar 36 mil m3 cúbicos de minério de ferro com areia marinha – o que equivale a 1.118 caminhões caçamba de três eixos – surgiu no final de 2017, quando a Vale assinou Termo de Compromisso Ambiental (TCA) com Estado, Ministérios Públicos Estadual e Federal.
O TCA livrou a mineradora de processos judiciais e abriu caminho para a renovação das licenças de Tubarão. Em contrapartida, além da redução do pó preto, a empresa teria que fazer um parque urbano em Vitória (já inaugurado) e retirar o minério que há décadas suja a porção norte da Praia de Camburi.
Esta última ação beneficiaria Vitória e viraria ônus para a Serra. Embora a Vale nunca tenha afirmado nem negado que os rejeitos podem vir para a Serra, a área aos pés do Mestre Álvaro foi licenciada pelo Estado em favor da empresa Marca Ambiental – especializada em aterros de resíduos – para receber rejeitos com as características do minério com areia. Isso dias depois da assinatura do TCA.
É justa a reação do município. A Serra sofre com impactos ambientais e sociais da implantação do complexo de Tubarão. Mas fica com parte menor dos impostos, pois a maior fatia vai para Vitória. Não obstante, o município coloca mais de R$ 1 milhão por ano na Estação Conhecimento, projeto ligado à Vale e usado pela empresa para publicidade e balanço de suas ações de responsabilidade social.
Tudo isso num contexto em que a mineradora deixou o Brasil estarrecido com o estouro da barragem de Brumadinho e Mariana – esta última da Samarco, joint venture controlada por Vale e BHP. Centenas de pessoas mortas e milhares afetadas pela contaminação dos rios São Francisco, Doce e oceano Atlântico, e ainda outros milhares afetados pelo desemprego com a consequente paralisação das atividades do arranjo mínero-siderúrgico.
Estarrecimento que ganhou novos contornos esta semana com a indecente proposta dos governos federal e mineiro de ceder à Vale a gestão de parques nacionais – incluindo o emblemático Caparaó – em troca de a empresa não ter que pagar multas milionárias pelo crime ambiental de Brumadinho. Escárnio tem limite. E a Serra está dando o seu recado.