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Mestre Álvaro
Yuri Scardini é autor do livro 'Serra: a história de uma cidade' e escreve sobre política e economia

Novo ‘porto’ é a chance de corrigir ‘pernada’ milionária de Vitória na Serra

Praia Mole, na divisa entre Serra e Vitória, será o local do novo terminal para movimentação de petróleo. Crédito: Divulgação

Esta semana foi divulgada uma excelente notícia para a economia capixaba: o Porto de Praia Mole, localizado entre Serra e Vitória, será dinamizado e passará a movimentar petróleo e seus derivados. Trata-se de mais um avanço no enfrentamento das limitações portuárias históricas do Espírito Santo.

No que pesa a relevância do anúncio, a novidade reacende outro debate: a distribuição da arrecadação de tributos, especialmente o ISS (Imposto Sobre Serviços). Embora o porto esteja situado também no território da Serra, toda a arrecadação do imposto é registrada em Vitória — o que representa perdas milionárias ao município vizinho.

Antes de aprofundar essa discussão, é importante contextualizar. Com a expansão da economia nas últimas décadas, os gargalos portuários histórico se tornaram ainda mais urgentes, e diversas soluções vêm sendo adotadas. É evidente que não existe uma única saída para superar essa barreira. Trata-se de um conjunto de esforços logísticos, regulatórios e estruturais. E, nesta semana, um passo importante foi anunciado: a implantação do Terminal de Granéis Líquidos (TGL) de Praia Mole, voltado à movimentação de petróleo e seus derivados – uma espécie de dinamização do Porto de Praia Mole.

Para se ter uma ideia da dimensão do projeto, o investimento estimado é da ordem de R$ 340 milhões, oriundos da iniciativa privada. O terminal terá capacidade para movimentar até 14 milhões de toneladas de petróleo por ano — o equivalente a cerca de 100 milhões de barris, o que representa, em valores estimados, aproximadamente US$ 8,5 bilhões por ano, ou R$ 43 bilhões na cotação atual.

O novo terminal será operado pela Blue Terminals, empresa da Zmax Group. A estrutura, voltada para Carapebus, permitirá operações entre navios de grande porte. A localização é estratégica, protegida por molhe (estrutura de engenharia marítima feita com pedras ou concreto), com baixa incidência de correntes e ondas, o que garante segurança e eficiência.

Embora seja comum chamá-lo de “Porto de Praia Mole”, tecnicamente trata-se de um Terminal Privativo de Uso Misto (TPS), funcionando como um condomínio portuário gerido por ArcelorMittal Tubarão, Usiminas e Gerdau, voltado à movimentação da cadeia siderúrgica. Ou seja, não é um porto público organizado, mas sim uma estrutura privada com autorização da União para operar.

Em outras palavras, é um terminal controlado, com foco em cargas específicas. Praia Mole integra o Complexo Portuário de Tubarão — um dos mais modernos do mundo — e, a partir de agora, também passará a receber petróleo e derivados por meio do novo TGL. A estrutura será construída em uma área ociosa, atualmente em desuso, na Ponta de Tubarão, precisamente na divisa entre Serra e Vitória.

De acordo com informações divulgadas à imprensa, o projeto já está avançado em termos burocráticos, e o início das operações é previsto para o segundo semestre de 2027. As negociações comerciais também estão em estágio adiantado. Talvez esse seja o prazo que a Serra tem para colocar na mesa um debate necessário sobre o desequilíbrio tributário.

Nas cidades de maior porte, como os municípios da Grande Vitória, o ISS costuma ser a principal fonte de arrecadação direta. Em 2024, por exemplo, a Serra arrecadou R$ 427 milhões em ISS. Já Vitória obteve R$ 876 milhões — quase o dobro. Trata-se da principal receita da capital, superando inclusive a cota-parte do ICMS e outras transferências constitucionais.

E isso não é por acaso — é um reflexo histórico da formação político-administrativa do Espírito Santo. Vitória, como capital, consolidou práticas que resultaram em uma espécie de pilhagem tributária ao longo do tempo. Foi assim no antigo Distrito de São José do Queimado, então um importante centro agrícola, e também no Complexo de Tubarão, onde os maiores impactos sociais e ambientais ficaram para a Serra, enquanto a maior parte da arrecadação ficou com Vitória.

É nesse contexto que o novo Terminal de Granéis Líquidos se insere, dinamizando o chamado Porto de Praia Mole. Uma oportunidade para que a Serra reabra o debate sobre o rateio fiscal.

A principal gestora do porto, ArcelorMittal Tubarão, fica localizada na Serra. Todos os acessos rodoviários e ferroviários para Praia Mole estão em território serrano. O município absorve impactos urbanos sufocantes, especialmente na região de Carapina, que sofre com o tráfego pesado de caminhões e com as restrições impostas pela linha férrea. Soma-se a isso uma série de desafios sociais como o tráfico de drogas e a prostituição.

Não por acaso, os bairros próximos a entrada de Praia Mole – como Limoeiro e São Geraldo – enfrentam esses problemas desde a implantação da antiga CST, nos anos 1980. O que está em jogo agora é a chance de a Serra deixar de ser apenas um território de passagem e sacrifício para o Porto de Praia Mole.

Até porque existe uma controvérsia histórica sobre os limites territoriais entre Serra e Vitória. A capital acabou ficando com todos os portos do Complexo Industrial de Tubarão, além das oito usinas de pelotização da Vale. E isso porque a coluna não vai entrar nos aspectos da formação da Serra enquanto fenômeno urbano pós-1960 — pois a dívida histórica de Vitória com a Serra é difícil até de dimensionar.

Em 2017, o Tempo Novo realizou uma série de reportagens que escancararam o tamanho da injustiça tributária. Na ocasião, Vitória se valeu de uma lei de sigilo fiscal, instituída ainda durante a Ditadura Militar, para não divulgar os dados de arrecadação do ISS em Praia Mole. Fato é que, se na época os valores já eram expressivos, agora devem crescer ainda mais. A previsão é de que, com o início das operações do novo Terminal de Granéis Líquidos em 2027, sejam arrecadados aproximadamente R$ 156 milhões por ano em tributos como PIS, COFINS, IR e ISS.

Desses, todo o ISS vai para os cofres de Vitória. Além disso, embora o Imposto de Renda seja um tributo federal, parte dele é redistribuído aos municípios por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Em 2024, esse fundo transferiu R$ 278 milhões para Vitória, enquanto a Serra recebeu menos da metade desse valor.

Ou seja, um debate que já era importante ganha agora ainda mais relevância, impulsionado por um contexto factual que exige uma discussão sobre uma divisão mais justa — não apenas à luz da geografia, mas, sobretudo, em respeito aos impactos humanos e ambientais.

Por exemplo, que isso nunca aconteça, mas é importante destacar que o novo terminal ficará voltado para Carapebus, território da Serra. As operações serão realizadas por meio de transferência a contrabordo (ship to ship) — uma técnica em que dois navios são posicionados lado a lado no mar (um “navio-mãe” e outro “recebedor”), e o petróleo é transferido entre eles por meio de mangueiras especiais ou braços hidráulicos. Em caso de acidente, como um vazamento, os impactos ambientais serão sentidos principalmente no litoral sul da Serra. Mas, mesmo assim, a cidade não participa da arrecadação do ISS gerado por essa operação.

O projeto certamente trará ganhos para a Serra — afinal, está inserida em uma economia metropolitana. Um dos principais benefícios será a geração de empregos: estudos estimam a criação de cerca de 4 mil vagas diretas e indiretas, das quais uma boa parcela deve contemplar moradores da própria Serra.

Também haverá o rateio dos royalties, estimados em R$ 80 milhões por ano. Vitória ficará com 40% desse montante, enquanto Serra e Vila Velha dividirão os 60% restantes, com 30% para cada uma — o que representa um incremento direto de aproximadamente R$ 24 milhões aos cofres serranos.

Ainda assim, isso não compensa o descompasso tributário. Não repara o percurso histórico que a Serra precisou trilhar para suportar tantos impactos. Não cobre os efeitos ainda não superados — nem os que ainda virão.

A notícia é, sim, muito positiva. A dinamização do Porto de Praia Mole é uma pauta debatida há anos na Serra. Trata-se de um empreendimento ousado, com grande potencial de sucesso e expansão. Mas também é uma oportunidade para rediscutir a relação institucional entre Serra e Vitória, muitas vezes marcada por desequilíbrios — e, quase sempre, com a Serra sendo a parte lesada.  

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