Mestre Álvaro
Yuri Scardini é autor do livro 'Serra: a história de uma cidade' e escreve sobre política e economia

Weverson versus Muribeca, o blefe de Vidigal e Audifax e caos instalado na política da Serra

Vidigal deu um nó na política da Serra. Crédito: Samuel Chahoud.

Após o final de semana e as primeiras reações ao evento considerado histórico, no qual o prefeito Sergio Vidigal (PDT) renunciou à possibilidade de concorrer à reeleição, anunciou sua “aposentadoria” das urnas e apontou Weverson Meireles como seu sucessor, é possível especular sobre os desdobramentos futuros.

A decisão de Vidigal é descrita como “histórica” pelo fato inédito de um prefeito da Serra tomar tal atitude. O mecanismo de reeleição foi instituído no Brasil em 1997, desde então, nenhum prefeito da Serra havia optado por não buscar a reeleição, limitando-se a Sergio Vidigal e ao ex-prefeito Audifax Barcelos (PP), o que tornou o acontecimento até os últimos momentos ainda mais difícil de acreditar.

As razões apresentadas por Vidigal para sua decisão envolvem questões familiares, como a luta de sua esposa, Sueli Vidigal, contra o câncer, o enfrentamento da doença de Alzheimer por seu pai e os desafios em manter um relacionamento próximo com seus filhos e netos devido às demandas do cargo público.

Esses motivos, altamente respeitáveis, asseguram que Vidigal encerre seu ciclo à frente da Prefeitura da Serra de maneira extremamente digna, independentemente dos resultados eleitorais deste ano. Ou seja, para efeitos de legado, história e currículo – itens aos quais Vidigal tem muito zelo – estarão salvaguardados. Assim, ele resolve a sua própria trajetória e pode ainda buscar uma sobrevida de sua influência pelas mãos de Weverson, um jovem criado dentro do PDT.

Essas foram as razões, podemos dizer, emocionais que influenciaram a decisão de Vidigal. No entanto, não podemos ignorar os aspectos racionais e pragmáticos que também entraram em jogo. Um extenso estudo qualitativo foi realizado, destacando pontos que poderiam representar desafios, apesar da gestão de Vidigal ser bem avaliada. Nas eleições anteriores, ficou evidente que o prefeito tem um limite de votos, situando-se um pouco acima de 100 mil. Conseguir aumentar significativamente esse número nas urnas é uma tarefa árdua e incerta. Com isso, Vidigal escolheu encerrar sua carreira enquanto ainda está bem avaliado e por motivos nobres, assemelhando-se a um jogador de futebol que decide se aposentar no auge ao invés de prolongar sua carreira até um declínio inevitável.

O evento

O evento foi marcado por emoções intensas e declarações muito fortes. Antes de tudo, tratou-se de um momento autêntico e legítimo em todos os sentidos, seja na perceptiva humana ou política. A marqueteira, Jane Mary, que é de longe a maior profissional da área política no que diz respeito a Serra, foi a responsável pelo refinamento do evento trazendo uma camada de sofisticação maior e minuciosamente planejada. Mas com a dissipação das emoções iniciais, o pragmatismo eleitoral toma frente. A decisão de Vidigal sacudiu o cenário pré-eleitoral da Serra, deixando muitos no meio político e partidário desorientados. Teorias, hipóteses e cenários são amplamente discutidos.

Muribeca é o melhor adversário

Analisando objetivamente as declarações, e deixando de lado a emocionalidade habilmente trabalhada por Jane, torna-se claro que a pré-campanha do indicado por Vidigal, Weverson Meireles, irá focar na polarização com o deputado estadual Pablo Muribeca (Republicanos). Pablo ficou conhecido por suas críticas incisivas a Vidigal nos últimos três anos e agiu como um chicote no lombo da administração municipal. Olhando em perspectiva, lá trás talvez Vidigal tenha visto uma oportunidade a ser explorada em Muribeca, já que é evidente que o PDT o elegeu como adversário. A intenção parece ser posicionar Weverson como a antítese de Pablo, representando uma renovação responsável e segura em contraposição a uma renovação considerada por Vidigal, como irresponsável ou arriscada.

Há, explicitamente, uma estratégia de desqualificar Pablo como alguém confiável para o cargo de prefeito e capaz de enfrentar os desafios que a cidade, com os maiores desafios públicos do Espírito Santo, demanda. Uma das táticas é apresentar Pablo como um TikToker para questionar sua capacidade de debater temas complexos, uma vez que a plataforma é comumente associada a entretenimento superficial e conteúdo viral rápido.

Essa estratégia é muito bem pensada, considerando que, apesar de o eleitorado serrano demonstrar flexibilidade em votos legislativos, a escolha do prefeito historicamente comprova que a maioria dos eleitores é extremamente criteriosa e pouco inclinada a mudanças bruscas.

Pablo é considerado pelo núcleo janemerista/vidigalista o melhor adversário disponível, pois acreditam que será mais fácil atribuir a ele a imagem de candidato impulsivo, inexperiente, extravagante e pouco confiável. Essa estratégia não é infundada. Jane Mary e Vidigal conhecem muito a Serra e como se comporta os serranos.

O fenômeno de web, Pablo que foi chicote por três anos, foi alçado deliberadamente a condição de adversário número um por apresentar mais vulnerabilidades exploráveis na construção de imagem de Weverson, articulando um discurso entre a escolha de um ‘novo bom’ versus ‘novo ruim’, podendo ganhar terreno através do engajamento positivo e negativo gerado por Muribeca.

‘Audifax é um caso de sucesso e Weverson também será’

Ficou bem definido também, por exemplo, que a pré-campanha de Weverson não quer conflito [neste momento] com Audifax. Na verdade, ao contrário, o ex-prefeito foi apresentado como um projeto de sucessão que deu certo no passado em termos de gestão. Um nome escolhido lá trás, com responsabilidade e que foi bom para a Serra, ainda que, dentro dessa narrativa, Audifax tenha falhado quanto a fidelidade – o que teria causado o racha entre ele e Vidigal.

Só que diferente de antes, o prefeito estaria apresentando não apenas um nome que irá renovar a política da Serra pelos próximos anos – que é um desejo de parte do eleitorado – mas que dentro desse discurso, agregaria a capacidade de dar seguimento ao projeto de desenvolvimento sem que haja rupturas e brigas, ressaltando que a divisão política entre Audifax e Vidigal é vista como frustrante para o eleitor serrano, já que o sentimento é que juntos, ambos poderia ter realizado mais.

Nessa linha, de polarizar com um pré-candidato mais vulnerável e que gera mais engajamento, Audifax seria um adversário menos útil neste primeiro momento, já que sua fama de gestor experiente é uma barreira na construção de imagem de Weverson, além do fato de se tratar de um dos políticos mais frios e calculistas do Espírito Santo. A única ‘vantagem’, por assim dizer, é que Weverson é o ‘novo’, e Audifax é o ‘velho’, o que pode ser usado posteriormente.

Audifax e Vidigal juntos?

Os sinais de uma possível união entre Vidigal e Audifax, por ora, parecem mais um jogo de cena. Vidigal expressa disposição para dialogar com Audifax, pois, dentro desta narrativa, como ele poderia posicionar Weverson como um sucessor adequado se Audifax representasse um fracasso anterior de Vidigal? Isso sugeriria um erro repetido por parte do prefeito? A narrativa construída é justamente o contrário: ‘vejam, Audifax fez um bom trabalho pela Serra, foi uma escolha acertada, e agora estamos apresentando um novo sucessor’. Nessa lógica, o que distinguiria Audifax de Weverson seria a questão da lealdade e a união.

Do lado de Audifax, como ele poderia agir de forma diferente, dadas as nobres e dignas razões apresentadas por Vidigal para não buscar a reeleição, como o bem-estar familiar e os cuidados com sua esposa diante de sua complexa condição de saúde? Audifax, tendo enfrentado ele mesmo uma grave situação de saúde, dificilmente poderia parecer insensível à adversidade alheia.

Entretanto, esse blefe entre os dois pode evoluir para algo mais concreto à medida que o processo eleitoral avança. Primeiramente, porque o ‘gelo’ entre eles foi rompido. Ademais, Muribeca parece ser um problema comum a ambos, e com a retirada de Vidigal da disputa eleitoral, a situação se tornou mais complexa, abrindo possibilidades para que os acontecimentos tomem rumos variados, potencialmente unindo-os. Portanto, embora neste momento pareça ser apenas uma manobra estratégica, a porta está entreaberta para o imprevisível futuro que se aproxima.

Outra questão, mais subjetiva, diz respeito a uma dimensão espiritual entre eles. Essa inclinação já é observável em ambos, apesar do domínio do pragmatismo político. Talvez nunca cheguem a um consenso sobre os motivos, razões e ações que os conduziram por caminhos divergentes. Porém, conforme o tempo avança para ambos, parece haver uma maior disposição à compreensão de que a vida é efêmera, o que naturalmente promove uma tendência à resolução de conflitos.

Quatro meses de pré-campanha

Há uma enormidade de variáveis a serem listadas; pois o PDT pode fazer seus planos, mas eles estão sujeitos a uma cadeia de acontecimentos e atores externos. O tempo é curto e a cidade é grande e com muita diversidade. Polarizar Weverson com Pablo e minimizar com Audifax parece um tanto quanto racional nesse primeiro momento, em que as coisas ainda estão muito embaralhadas. Mas será que isso vai descer a tempo?

Sobre esse tópico, salta aos olhos que Vidigal tenha optado por apresentar seu sucessor muito antes do que Audifax fez em 2020. Além disso, ao citar questões familiares como justificativa para sua não candidatura, Vidigal utilizou, antecipadamente, uma narrativa de muito forte [analisando friamente, já que se trata de uma questão sensível], capaz de gerar grande impacto emocional se fosse trazida à tona nas últimas semanas antes do período eleitoral.

Isso se deve pelo fato de que a experiência com Audifax em 2020 mostrou que, apesar de todo o aparato audifista somado ao poderio da família de Fábio Duarte, o sucessor de Audifax alcançou 18% dos votos no primeiro turno. Na situação presente, a mesma porcentagem não seria suficiente para levar Weverson ao segundo turno. Por isso, Jane Mary e Vidigal se anteciparam, pois será preciso fazer mais.

Suposição comum, mas…

A suposição comum de que os eleitores de Vidigal migrariam majoritariamente para Audifax é questionada quando um dos competidores se retira de forma deliberada por razões altruístas, afetando negativamente a dinâmica de polarização que beneficiou ambos por mais de uma década. Um segmento majoritário de eleitores tende a apoiar Vidigal ou Audifax, não um novato. Entretanto, Weverson representa uma novidade endossada por Vidigal, que, assim como Audifax no passado, foi parte de uma gestão pública bem-sucedida. Isso confere a Weverson uma aura de segurança aos olhos dos eleitores mais tradicionais.

Com a saída consciente de Vidigal, surge a possibilidade de Audifax ser questionado ou pressionado a também renunciar à dinâmica de alternância no poder, um movimento que Vidigal já adotou. Naturalmente, a barreira é conseguir difundir uma narrativa desse tipo a tempo, considerando o tamanho do eleitorado. Aliás, esse sempre foi um dos maiores desafios na eleição da Serra, conseguir alcançar a massa da população.

Por fim…

Tudo isso diz respeito apenas à tentativa de compreender os planos do PDT. Além disso, existem as estratégias de Audifax e Pablo Muribeca, já mencionados, que de alguma maneira precisarão se ajustar a esse novo cenário. Ainda há questões pendentes, como o futuro do PSDB de Vandinho Leite, a continuidade ou não da aliança com o deputado Alexandre Xambinho, além do PSB, do governador Renato Casagrande e da família Lamas, que também foram surpreendidos por esses acontecimentos.

Será que essa conjuntura também pode afetar a governabilidade de Vidigal junto à Câmara da Serra? Um fato certo é que estimula movimentações em outros partidos. Por exemplo, o PL, nesta terça-feira (19), quase oficializou Igor Elson como pré-candidato a prefeito, com o apoio de Bolsonaro. Esse cenário compõe um verdadeiro emaranhado de complexidades, algo que não se observava há bastante tempo. De longe, a eleição da Serra é a mais incerta da Grande Vitória. É a cidade com o maior eleitorado e a maior economia sob os olhares atentos do Espírito Santo. No fim, tudo isso reflete bem a complexidade do que é esse município.

Serra Podcast

Conheça o Serra Podcast: a nova forma do Tempo Novo se comunicar com você, leitor.

Serra Podcast

Conheça o Serra Podcast: a nova forma do Tempo Novo se comunicar com você, leitor.

É feriado nesta quarta-feira: veja o que funciona e o que não abre na Serra

Feriado Nacional: no dia 1º de maio celebra-se o Dia do Trabalhador, e tanto o comércio quanto as repartições públicas funcionam em horário especial. Para...

Cobras invadem condomínio da Serra e causam pânico em moradores

Os moradores de um condomínio em Balneário de Carapebus, na Serra, estão cada vez mais preocupados com frequentes invasões de cobras nas áreas comuns...

Estado abre concurso público com 600 vagas e salários de R$ 1.890 a R$ 8.013

O Governo do Estado anunciou, através da Fundação Estadual de Inovação em Saúde – iNOVA Capixaba, a abertura de um novo concurso público com...

Ouriços invadem casa na Serra e são resgatados pela Fiscalização Ambiental

Um casal de ouriços-cacheiros foi resgatado pela equipe da Fiscalização Ambiental na manhã desta segunda-feira (29). Os roedores, conhecidos por terem espinhos em sua...

Poeta Teodorico Boa Morte dá nome a biblioteca da Estação Conhecimento na Serra

A Estação Conhecimento Serra, que funciona em Cidade Continental, realiza nesta terça (30), às 15h, a inauguração de dois novos equipamentos que prometem ter...

A Serra pode e deve competir com Itaparica no mercado imobiliário e construção civil, mas depende de Manguinhos

Há alguns anos, os Censos Imobiliários confeccionados e publicados pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Espírito Santo não deixam dúvidas...

Morar Construtora lança novo condomínio-clube perto de Bicanga na Serra

No dia 20 deste mês, a Morar Construtora realizou o evento de lançamento do seu mais recente empreendimento: o Vista do Passeio Condomínio-Clube. Localizado...

Jovem de 24 anos é encontrado morto em mangue na Serra

Um jovem de 24 anos – identificado como Luiz Henrique Batista da Silva – foi encontrado morto em um manguezal próximo ao bairro Jardim...
Anúncio
close-link