Inclusão de alimentos orgânicos na merenda escolar; construção de salas de aula; oferta de internet gratuita em praças, parques e pontos turísticos; desapropriação de área; drenagem e pavimentação de ruas; oferta de auxílio-aluguel e de auxílio-funeral.
Esses são alguns exemplos dos propostas apresentadas por vereadores da Serra em 2021 e que, por se tratarem de projetos indicativos, dificilmente sairão do papel.
Limitados pela Lei Orgânica Municipal (LOM), vereadores da Serra encontraram uma forma de propor toda sorte de projetos, e com isso oferecer resposta à população sobre suas demandas. Endereçam as propostas ao Executivo e deixam a cargo deste acatar ou não as indicações.
A saída encontrada pelos vereadores se baseia no entendimento de que os vereadores e deputados não podem criar projetos de lei que gerem despesas para a Administração (Prefeitura ou Governo). Esse entendimento está na Constituição (Federal, Estadual e Lei Orgânica) no artigo que disciplina a iniciativa do Chefe do Executivo em determinados tipos de leis.
Gilson Gomes Filho é advogado, especialista em Direito Público. Foto: Divulgação
Para o advogado Gilson Gomes Filho, especialista em Direito Público, esse entendimento limita demais a atuação parlamentar e criou um Poder muito concentrado nas mãos do Executivo.
“Mas pode, por exemplo, criar políticas públicas, criar obrigações que imponham um custo financeiro, sendo necessário porém que haja previsão orçamentária para isso, que é feita por meio de anulação de despesas de outras áreas (os parlamentares podem fazer a criação da despesa e a anulação de outra despesa de uma vez)”.
Gilson Gomes acrescentou ainda que os projetos do tipo indicativo não são projetos de lei, efetivamente. “São meros simulacros que não passam de sugestões até interessantes que disciplinam políticas públicas relevantes, entretanto, sem qualquer eficácia e que poderiam ser substituídos por meros ofícios protocolados na Prefeitura/Governo, que em seguida decidirá se vai encaminhar efetivo projeto de lei ao Legislativo”.
“Alguns parlamentares se socorrem deste tipo de projeto porque estão desalinhados ao Executivo ou desarticulados no parlamento, sem simpatizantes o suficiente para aprovarem seus projetos, vendo neles uma forma de obter notoriedade ou empatia com o eleitorado. Por outro lado, grande parte faz por desconhecer que os parlamentares podem sim propor leis que geram despesas ao Executivo, já que o STF em repercussão geral já superou o ultrapassado entendimento que antes proibia essa iniciativa”, finalizou o advogado.
Popularidade:
Um ex-vereador ouvido pela reportagem é crítico ao tipo de proposição.
“O projeto indicativo e indicação de vereador deveria ser feito por meio de ofício. Tem custo alto, tempo e papel jogado fora para nada. Só a capa de cada projeto custa, em média, R$ 10. O custo é alto, pois cada setor e secretaria por onde passa recebe um despacho. É um absurdo o custo desses projetos para a Câmara e para a gestão”, disparou.
O ex-parlamentar concluiu que “alguns vereadores podem apresentar o projeto indicativo com boa intenção; mas na maioria das vezes faz sabendo que não vai sair do papel; faz só para ganhar popularidade, enganando a população; é meramente uma ideia ao Executivo, e que na maioria das vezes torna-se arquivo e ainda é preciso gastar para guardar e acumular esses papéis”.
Até a tarde desta quarta-feira (19), 141 projetos indicativos haviam sido protocolados na Câmara da Serra.
Custos:
A reportagem acionou a Câmara da Serra sobre os custos e tramitação de projetos indicativos.
“O trâmite em si é similar ao de um projeto de lei: Presidência recebe a proposição; encaminha à Procuradoria para emissão de parecer jurídico (art. 139, Regimento Interno da Câmara Municipal da Serra – RICMS), devolvendo à Presidência após; admitido o prosseguimento da proposição, à Coordenação Legislativa para encaminhamento ao 1º Secretário, que o pauta; pautado, é encaminhado ao Plenário para leitura no Expediente do Dia; após, encaminhado às Comissões, sendo minimamente a Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final; devolvido das comissões, é remetido à Comissão Legislativa, que otramita ao 1º Secretário, que o pauta; pautado, é enviado ao Plenário para discussão e votação; aprovado, é encaminhado ao Poder Executivo”.
Sobre a definição de projeto indicativo, a assessoria da Câmara disse os termos do art. 136 do RICMS, projeto indicativo é “a recomendação da Câmara Municipal da Serra ao Poder Executivo local, no sentido de que este promova a abertura de processo legislativo que verse sobre matéria de sua competência”.
Sobre necessidade de veto ou sanção do Executivo, a assessoria disse que “por se tratar de recomendação, dispensa sanção ou veto”.
Mari Nascimento é repórter do Tempo Novo há 21 anos. Atualmente, a jornalista escreve para diversas editorias do portal, principalmente para a de Política.