A gigante mundial da celulose, Suzano, deve enfrentar em 2026 um corte de produção causado pelo desabastecimento de eucalipto em seu complexo industrial localizado em Aracruz, um dos maiores do mundo no segmento. A situação decorre da decisão da empresa de interromper o transporte de madeira vinda de Minas Gerais, por considerar o custo logístico inviável.
A informação foi divulgada pelo colunista Abdo Filho, de A Gazeta, que destacou que 20% do eucalipto usado no Complexo Industrial de Aracruz vem de Minas Gerais. A empresa traz a madeira por ferrovia, serviço que será interrompido a partir de dezembro.
E o que a Serra tem a ver com isso?
Com a interrupção do fornecimento mineiro, a Suzano passa a depender ainda mais da base florestal do Espírito Santo, de onde também extrai matéria-prima, mas que não é suficiente para suprir toda a demanda das fábricas de Aracruz.
A Serra tem participação relevante nessa base florestal, especialmente em áreas estratégicas para o futuro do desenvolvimento do município, que agora tendem a enfrentar ainda mais dificuldades junto à Suzano para que essas regiões sejam dinamizadas para além da monocultura do eucalipto.
Leia também
É importante destacar que a empresa classifica suas áreas de produção de eucalipto como “florestas”, mas, na visão de ambientalistas, pesquisadores e organizações socioambientais, tratam-se de desertos verdes, grandes extensões de monocultura que consomem muitos recursos naturais (especialmente água) e apresentam baixíssima biodiversidade.
Na Serra, a Suzano mantém cerca de 2,37 mil hectares de eucalipto, o equivalente a pouco mais de 4% do território municipal. Somando áreas de preservação, a empresa é dona de quase 9% da cidade, sendo de longe a maior proprietária de terras do município.
Essas áreas estão concentradas entre Jacaraípe e Nova Almeida, da faixa litorânea até as proximidades do Mestre Álvaro, passando pelo vale da Lagoa Juara. Por isso existe aquele “vazio urbano” ao longo da ES-010: grande parte desse território pertence à Suzano, que herdou essas terras da antiga Aracruz Celulose.
Além de praticamente não abrigarem biodiversidade, essas áreas não geram força econômica para a Serra, pois não produzem renda nem empregos. A coluna conversou com um servidor do setor de finanças da Prefeitura da Serra, que informou desconhecer qualquer arrecadação tributária relevante proveniente desses plantios. Toda essa extensão está em zona rural, o que significa que a empresa paga apenas o ITR (Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural), um imposto federal, muito mais baixo que o IPTU.
Negociações com a Suzano já foram frustradas
Circulam no mercado imobiliário informações de que grupos empresariais vinham tentando negociar uma fração dessas áreas para ampliação e implantação de novos negócios na cidade. Entretanto, há alguns meses, as negociações foram suspensas pela Suzano, justamente devido à maior dependência das áreas capixabas de eucalipto diante da impossibilidade de trazer madeira de Minas Gerais. Segundo essas informações, não há previsão de retomada das conversas por parte da empresa.
Recentemente, o presidente da Suzano, Beto Abreu, afirmou que “a prioridade da companhia no Estado é continuar crescendo a base florestal”. Isso, porém, não é rápido nem simples e implica necessariamente otimizar as áreas que a empresa já possui e adquirir novas propriedades. Por isso, vender terras está fora de questão, a menos que haja grande vantagem para a companhia. Na prática, a Suzano não vende áreas, costuma realizar permuta, trocando uma área menor, porém mais valorizada, por outra muito maior.
Mesmo que isso pudesse parecer vantajoso, trocar uma área já produtiva por outra ainda virgem não resolve o problema imediato. No Brasil, o ciclo do eucalipto (do plantio ao corte) dura de 6 a 7 anos, tempo que a empresa não tem disponível. O Complexo Industrial de Aracruz tem capacidade para produzir 2,3 milhões de toneladas de celulose por ano, mas atualmente opera em 2 milhões. A base florestal capixaba consegue suprir apenas 50% do eucalipto necessário; o restante vem da Bahia e de Minas Gerais.
Eucaliptos da Suzano são problema para Jacaraípe
Esse cenário ocorre em um momento em que o Governo do Estado está prestes a inaugurar o Contorno de Jacaraípe, uma das rodovias mais modernas do Espírito Santo. O novo viário liga o CIVIT II a Nova Almeida e integra a primeira etapa do projeto que pretende interligar a Serra ao complexo portuário em implantação em Aracruz, dentro do macroprojeto ParkLog, que busca expandir a vocação capixaba para o comércio exterior e para a logística.
Do ponto de vista conceitual, o trecho do Contorno de Jacaraípe tem potencial para funcionar como uma retroárea de apoio às operações portuárias de Aracruz, ampliando ainda mais o parque logístico da Serra, um setor que gera empregos, arrecada impostos e poderia dinamizar uma área hoje considerada “morta” para a cidade. No entanto, isso depende da disposição da Suzano em negociar parte de suas terras, possibilidade que agora parece ainda mais distante.
O desenvolvimento da Serra tem sido fortemente impulsionado pelas obras de infraestrutura rodoviária, que vêm beneficiando, por exemplo, a região norte da cidade. A área já recebeu investimentos privados robustos, como o Complexo SerraLog, com 200 mil metros quadrados de galpões, e a nova planta da Cedisa, que dobrará a capacidade produtiva da empresa. Esses investimentos foram estimulados pela inauguração do Contorno do Mestre Álvaro e tendem a crescer ainda mais com a Variante de São Domingos, em fase avançada de obras, e com o início da duplicação da BR-101 Norte.
A expectativa era de que essa região, a oeste de Jacaraípe, também experimentasse um novo ciclo de crescimento econômico, organizado e planejado, mas esse avanço já esbarra no “elefante branco” que os eucaliptais da Suzano representam para a Serra.

