Por que o Mestre Álvaro tem esse nome? A história da montanha capixaba que poderia ter sido o início do Brasil

Conheça a história da maior montanha da Serra, o Mestre Álvaro.
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Mestre Álvaro Serra
Mestre Álvaro, na Serra, Espírito Santo. Crédito: Divulgação

Você sabia que uma montanha da Serra poderia ter sido o primeiro ponto avistado pelos portugueses no Brasil? Com seus imponentes 833 metros de altitude, o Mestre Álvaro é uma das maiores elevações rochosas litorâneas do país — e guarda segredos históricos que até hoje intrigam pesquisadores.

Se as caravelas portuguesas tivessem navegado alguns graus mais ao sul, o Espírito Santo – e não a Bahia – poderia ter sido o marco inicial da colonização. Mas por que, mesmo com essa imponência, o Mestre Álvaro ficou praticamente ignorado pelos primeiros registros da época?

Por que “Mestre Álvaro”? Origem é mais sombria do que parece

Durante muito tempo, circularam lendas sobre a origem do nome: uns diziam que era um ermitão, outros juravam que o monte homenageava um mestre-escola. Mas tudo indica que essas histórias não passam de mito.

Pesquisas do historiador Clério José Borges apontam que o nome teria sido dado por jesuítas em 1560, em homenagem a Álvaro da Costa, filho do então governador-geral Duarte da Costa. Álvaro era comandante de navio e amigo pessoal do padre jesuíta Braz Lourenço — os dois, inclusive, viajaram juntos ao Brasil.

A versão sustenta que Braz batizou a montanha como “Mestre Álvaro” durante uma visita do amigo à capitania do Espírito Santo. A montanha teria servido como ponto de referência marítima e homenagem a um aliado da Companhia de Jesus. E mais: Álvaro da Costa foi acusado de trucidar tribos indígenas com crueldade — o que adiciona um tom sombrio à origem do nome.

Nova teoria: livro resgata pista deixada por D. Pedro II

Crédito: Divulgação

Além da tese defendida por Clério José Borges, uma segunda possibilidade foi apresentada no livro “Serra: A História de uma Cidade”. Nessa nova hipótese, o nome “Mestre Álvaro” estaria ligado não a Álvaro da Costa, mas sim a Álvaro Afonso, um importante colono da capitania do Espírito Santo.

A teoria parte de um relato feito ao imperador D. Pedro II durante sua visita à Serra no século 19. Na ocasião, um capitão local contou que a montanha teria recebido esse nome porque um mestre de navio chamado Álvaro a utilizava como ponto de referência marítima.

Essa memória oral foi reforçada por registros históricos de 1550, que mostram que Álvaro Afonso foi nomeado Alcaide do Mar e Guarda dos Navios, funções ligadas à proteção das áreas costeiras e à vigilância dos navios que atracavam no Espírito Santo. A montanha, visível desde o oceano, poderia ter sido batizada em sua homenagem, já que era usada como guia náutico.

Esse padrão de nomeação era comum à época. Um bom exemplo é o Morro do Moreno, nomeado em homenagem ao colono João Moreno, que vigiava a costa de Vila Velha. Assim, a tese sobre Álvaro Afonso se encaixa no contexto histórico, geográfico e cartográfico do período inicial da colonização — e se apresenta como uma das hipóteses mais sólidas até hoje.

Cartas e mapas antigos confirmam

Não é só suposição: mapas da época já mostravam o nome “Serra de Mestre Aluaro”, como o elaborado em 1586 pelo cartógrafo português Luís Teixeira. A escrita antiga reforça a autenticidade do batismo – e derruba de vez as explicações populares.

Aliás, o nome “Aluaro” era uma grafia comum do período. Assim como “Duartte”, “Dwarte” ou “Duardo” para Duarte, essas variações representavam o mesmo nome escrito de forma distinta conforme a época. A documentação cartográfica do século 16 e 17 reforça que o nome já era usado há muito tempo e com grafia legitimada.

Então… de onde vem, afinal, o nome Mestre Álvaro?

Apesar das versões diferentes, nenhum documento da época confirma com 100% de certeza quem batizou a montanha. Mas entre amigos de jesuítas, heróis controversos e vigias navais do início da colonização, a tese do colono Álvaro Afonso – primeiro Alcaide do Mar do Espírito Santo – é a que reúne mais coerência, contexto histórico e evidências indiretas.

O que sabemos com certeza é que o Mestre Álvaro é muito mais do que um cartão-postal da Serra: é um enigma geográfico, histórico e cultural que conecta o passado ao presente – e talvez, quem sabe, tenha sido o “verdadeiro Monte Pascoal” da história brasileira.

Foto de Yuri Scardini

Yuri Scardini

Yuri Scardini é diretor de jornalismo do Jornal Tempo Novo e colunista do portal. À frente da coluna Mestre Álvaro, aborda temas relevantes para quem vive na Serra, com análises aprofundadas sobre política, economia e outros assuntos que impactam diretamente a vida da população local. Seu trabalho se destaca pela leitura crítica dos fatos e pelo uso de dados para embasar reflexões sobre o município e o Espírito Santo.

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