O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) protocolou na 2ª Vara Criminal da Serra, na última quarta-feira (13), um pedido de medida cautelar para suspender imediatamente o exercício do mandato de quatro vereadores do município. A promotoria acusa os parlamentares de corrupção passiva e sustenta que há risco concreto de que eles voltem a cometer crimes semelhantes caso permaneçam nos cargos.
Os alvos da ação são:
- Cleber Lima Pereira, conhecido como “Cleber Serrinha” (MDB);
- Saulo Mariano Rodrigues Neves Júnior, o “Saulinho da Academia” e atual presidente da Câmara da Serra (PDT);
- Valteilton de Freitas Valim, o “Teilton” (PDT);
- Wellington Batista Guizolfe, o “Wellington Alemão” (Rede).
Além deles, a denúncia criminal também inclui Luiz Carlos Moreira, médico, e Aloisio Ferreira Santana, acusados de corrupção ativa, apontados pelo MPES como supostos responsáveis por oferecer ou prometer vantagens indevidas para influenciar uma votação.
Entenda as acusações do MP
O Portal Tempo Novo teve acesso à petição apresentada pelo Ministério Público. Segundo a promotoria, no primeiro semestre de 2024, os quatro teriam articulado a “promessa de vantagem indevida” para aprovar o Projeto de Lei nº 69/2024, de autoria do Poder Executivo. A proposta “institui a Política Pública de Regularização de imóveis urbanos de propriedade do Município da Serra dados em aforamento, em enfiteuse ou em emprazamento e dá outras providências”.
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O MPES relata que, no âmbito do projeto, foi apresentada uma emenda de autoria do vereador Wellington Alemão, cujo objetivo seria beneficiar uma área supostamente pertencente ao médico Luiz Carlos Moreira (co-denunciado). A emenda, instrumento legislativo usado para modificar projetos de lei, teria sido assinada eletronicamente por alguns vereadores sem que estes tivessem pleno conhecimento de seu conteúdo. Por conta disso, os vereadores realizaram uma reunião, que foi gravada, para entender as razões da emenda.
Emenda foi vetada
O projeto de lei mencionado pelo Ministério Público foi aprovado pela Câmara da Serra com a emenda sugerida por Wellington. No entanto, o Poder Executivo vetou essa alteração.
Ao retornar para a Casa de Leis, os vereadores decidiram manter o veto, preservando, assim, o texto original do projeto, exatamente como havia sido enviado à Câmara, sem as mudanças que supostamente beneficiariam Moreira.
A reunião que embasou as acusações
No dia da votação, Cleber, Teilton e Saulinho – este último na presidência da Casa – teriam procurado Wellington para questionar “o que estava por trás” da proposta e se havia algum tipo de pagamento ou promessa de vantagem em troca da aprovação. Um áudio, anexado ao processo e reconhecido pelos acusados como autêntico, registra Cleber questionando a possibilidade de haver algum benefício caso a emenda fosse aprovada.
Segundo a acusação, Wellington explicou que a oferta inicial era de R$ 100 mil, mas depois foi substituída por um terreno de 6 mil m² em Balneário Carapebus, “que valeria mais que os R$ 100 mil antes ofertados”, disse Wellington. A troca, no entanto, não teria agradado parte dos vereadores, levando Wellington a dizer:
“Se vocês não quiserem votar hoje e quiser que dá em dinheiro eu vou atrás do cara também, entendeu?”
Além desse episódio, o MP afirma que a conversa entre os parlamentares abordou outros projetos de interesse, como o Plano Diretor Municipal (PDM). Saulinho teria reclamado: “Nós passamos o que passamos no PDM (…) até hoje nada (…) claro que não temos que aceitar o que vem na hora”. O vereador William Miranda, que também participou da reunião, comparou o projeto em discussão ao PDM, dizendo que “isso virou um mini PDM”.
Para o MPES, essa e outras falas indicariam que houve negociação de vantagens na votação do PDM e que existiria disposição para repetir esse tipo de prática. A promotoria também aponta que os vereadores discutiram um outro projeto de lei, chamado por eles de “instrumento”, que poderia ser usado como moeda de troca futura.
O “instrumento” mencionado pelo Ministério Público é um complemento ao PDM e está com as tramitações paralisadas desde abril de 2025.
Wellington, na conversa, responde: “Eu quero que apareça mesmo [alguma vantagem indevida]. Que comigo não vai aparecer nada. Eu não ganhei nada”. Saulo rebate: “Nós não ganhamos porra nenhuma! Deixa o pau quebrar”.
A promotoria sustenta que o conjunto das falas demonstra a intenção deliberada de “vender” votos em troca de vantagens indevidas, condicionada apenas à existência de oportunidade.
O documento acrescenta que o áudio foi gravado pelo vereador à época Anderson Soares Muniz e periciado pela Polícia Civil, que confirmou a autenticidade do material e a preservação da cadeia de custódia. Ainda segundo o MPES, todos os denunciados reconheceram como suas as vozes registradas na gravação.
Ministério Público justifica pedido de afastamento dos vereadores da Serra
Para a promotora Giselle de Albernaz Meira, autora do pedido, há “justo receio” de que os acusados voltem a cometer delitos semelhantes, pois “já utilizaram de sua função pública para cometer crime” e mostraram disposição para novas práticas.
O MPES fundamenta o pedido no artigo 319, inciso VI, do Código de Processo Penal, que prevê a suspensão de função pública quando houver risco de sua utilização para prática criminosa. A promotoria argumenta que a medida é necessária para impedir a reiteração delitiva, proporcional por restringir apenas o indispensável e adequada para proteger a ordem pública.
Além da medida cautelar, a denúncia criminal contra os quatro vereadores foi protocolada paralelamente. Caso a Justiça aceite o pedido, Cleber Serrinha, Saulinho da Academia, Teilton e Wellington Alemão ficarão afastados dos cargos pelo tempo que durar o processo.
A reportagem está tentando contato com todos os vereadores envolvidos. Assim que as demandas forem respondidas, o texto será atualizado com os posicionamentos.

