
E a história do ibuprofeno de 2h em 2h toma um novo contorno. Isso porque o mesmo médico envolvido no caso — e que foi demitido pelo prefeito Weverson Meireles em seguida — já havia sido condenado a oito anos de prisão em regime fechado pelo crime de estupro de vulnerável. Como a condenação ocorreu em primeira instância, o médico ainda recorre em liberdade e continua atuando profissionalmente.
O crime aconteceu em 2022, em um hospital da cidade de Vila Velha. Mas a história é ainda mais grave: a vítima, uma mulher, sofreu violência sexual em um contexto extremamente delicado. Ela procurou atendimento médico após realizar uma curetagem — procedimento para remover tecido do interior do útero — necessária após um aborto espontâneo.
Com dores no colo do útero e corrimento anormal, a paciente buscou ajuda médica. Durante o exame de toque, ela relatou ter sido submetida a perguntas de cunho sexual feitas pelo médico. Assustada, correu até o banheiro do consultório para se vestir. Segundo o relato, o médico forçou a entrada e cometeu o abuso sexual.
A vítima acionou a Justiça e o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) entrou com a denúncia. A perícia confirmou os indícios da violência e, em 2024, o médico foi condenado. O mesmo médico foi demitido pela Prefeitura da Serra na tarde desta terça-feira (29) após a denúncia de uma paciente de 26 anos, que havia procurado a UPA da Serra Sede no dia anterior com dores no corpo e teria recebido uma receita com superdosagem de medicamento.
Trata-se do mesmo profissional condenado no ano passado por estupro de vulnerável. Desta vez, ele prescreveu ibuprofeno de 600 mg com intervalos de apenas duas horas — uma dosagem completamente atípica, que pode causar intoxicação grave, com risco de falência de órgãos, hemorragias e até morte. A recomendação segura, segundo normas médicas, é administrar o medicamento em intervalos de 6 a 8 horas, respeitando a dose máxima diária permitida.
O erro foi percebido e corrigido ainda na farmácia popular da própria UPA, felizmente sem causar danos à paciente. Segundo informações apuradas, a ordem de demissão teria partido diretamente do prefeito Weverson Meireles. O médico não é servidor efetivo — trata-se de um profissional contratado no modelo de pessoa jurídica (PJ), o que permite maior flexibilidade para a Prefeitura encerrar o contrato de prestação de serviço.
Em quatro meses de gestão, este é o segundo médico demitido por ordem direta do prefeito Weverson Meireles. O primeiro caso ocorreu há algumas semanas, quando um morador da Serra teria sofrido negligência médica em atendimentos realizados em duas UPAs da cidade e acabou falecendo. O médico responsável foi demitido, e os enfermeiros envolvidos foram afastados.
Politicamente, Weverson vem cumprindo o que prometeu em janeiro, quando encaminhou à Câmara Municipal da Serra um pacote de medidas para atualizar as regras que regem a relação entre a administração pública e os servidores municipais. Segundo ele, o objetivo é combater práticas abusivas e o descaso com o serviço público, com o compromisso de demitir assediadores, maus profissionais e servidores que não cumpram a carga horária.
Na prática, o projeto endureceu as regras de conduta no serviço público, introduzindo novas definições e punições para práticas como assédio moral, assédio sexual e inassiduidade. Do ponto de vista cultural, não é comum que a Prefeitura adote uma postura tão firme no enfrentamento e punição de profissionais da saúde acusados ou com indícios de erro médico dado especialmente a dificuldade de oferta de mão de obra disponível.
A postura adotada pelo prefeito deve gerar conflito com o Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES). A entidade já se pronunciou publicamente sobre a demissão do médico, criticando a medida e sugerindo que a Prefeitura teria ultrapassado os limites administrativos ao dispensar o profissional antes da conclusão de um processo ético ou judicial. Cenas para os próximos capítulos.