Em julho, exportações da Serra para os EUA despencam, enquanto comércio com a França dispara

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Incertezas e instabilidade da política tarifária de Trump derrubaram o comércio da Serra com os EUA. Crédito: Divulgação.

As tarifas de Trump já alteraram expressivamente a configuração exportadora da Serra. Em julho de 2025, o município da Serra registrou exportações no valor de US$ 173 milhões, o que representa uma queda de 37,5% em comparação ao mesmo mês do ano anterior. Apesar da retração, a cidade conseguiu, em parte, contornar a instabilidade do mercado norte-americano, ampliando seu comércio com a Europa, especialmente com a França.

Pelo menos é o que revelam dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), por meio da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Julho foi o mês em que o presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou tarifas de 50% sobre as exportações brasileiras, provocando fortes alterações nos mercados devido às incertezas. Apenas no final do mês o governo dos Estados Unidos confirmou os detalhes da taxação, incluindo a lista de itens isentos.

Dois efeitos principais foram observados:

1. Queda acentuada das exportações da Serra, de 37,5% em relação a julho de 2024.

No primeiro semestre de 2025 (janeiro a junho), o município exportou US$ 849,17 milhões em produtos, mantendo-se como a segunda maior exportadora do Espírito Santo, com 16,8% de participação nas exportações estaduais.

Esse cenário mudou em julho, primeiro mês do segundo semestre e período em que as tarifas foram anunciadas. A Serra caiu para a 3ª posição no ranking das exportações capixabas, sendo superada por Anchieta, município onde a Samarco opera. A cidade do sul capixaba registrou um aumento expressivo nas vendas para a China, obtendo um desempenho superior ao da Serra no mês.

Essa mudança já era, em certa medida, esperada, considerando que a Serra era, até então, o município capixaba mais dependente do comércio com os Estados Unidos.

2 – Diversificação de parceiros com a perda substancial da importância dos EUA nas exportações da Serra.

Os Estados Unidos têm sido, há muitos anos, os maiores parceiros comerciais da Serra. Para se ter uma ideia, em todo o ano de 2024, cerca de 62% de tudo o que foi exportado pelo município teve como destino o mercado norte-americano.

De janeiro a junho deste ano, o percentual foi ainda maior: expressivos 74,6% das vendas externas foram direcionadas aos norte-americanos — um total de US$ 633 milhões. No entanto, após a divulgação das tarifas — mesmo com vigência apenas a partir de agosto —, o impacto já foi sentido em julho, alterando de forma radical a configuração exportadora da cidade. Os EUA perderam mais da metade de sua participação percentual no mês, em comparação com o resultado do primeiro semestre.

Nos seis primeiros meses de 2025, a lista dos cinco principais parceiros comerciais da Serra foi composta por: Estados Unidos (74,6%), Reino Unido (4,3%), Canadá (3,1%), Polônia (2,53%) e Itália (2,51%).

Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), por meio da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Com o anúncio das tarifas de Donald Trump, esse cenário mudou sensivelmente em julho. Os Estados Unidos seguem como principal destino das exportações da Serra, mas não mais com os 74,6% registrados no primeiro semestre. Em julho, essa participação caiu para 34,5% (US$ 59,7 milhões), ou seja, uma queda superior à metade. Trata-se de um efeito típico de cenários instáveis no comércio internacional.

Em segundo lugar aparece a França, que até junho ocupava apenas a sexta posição (com 2,33%) entre os parceiros comerciais do município e, em julho, foi destino de 29,3% (US$ 50,7 milhões) de tudo o que a Serra exportou. Trata-se de uma variação percentual de 1.157% na comparação de julho com o primeiro semestre de 2025.

A Argentina também ganhou relevância como alternativa para escoar a produção local. O país vizinho, que até junho estava apenas na 15ª posição no ranking de destinos (com 0,37%), saltou para a 3ª colocação em julho, respondendo por quase 10% das vendas externas da cidade (US$ 16,4 milhões).

Fecham o grupo dos cinco principais parceiros comerciais em julho a Alemanha, com 9,3% (US$ 16 milhões), e a Itália, com 4,2% (US$ 7,2 milhões), reforçando a crescente importância do mercado europeu para os produtos da Serra.

Dados comparativos percentuais – julho x 1º semestre de 2025. Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Produtos – aço e rochas

Esse volume de exportação da Serra está diretamente ligado ao beneficiamento de rochas ornamentais, segmento no qual o município concentra um grande número de empresas. Essa estrutura faz da cidade a maior exportadora do setor no Brasil, tendo os Estados Unidos como principal destino.

A Serra não possui jazidas de extração de blocos, mas recebe a rocha bruta de outras regiões e realiza o processamento para uso final, transformando-a em chapas de granito ou mármore polidas ou resinadas, entre outros produtos. Esse material é reconhecido mundialmente pela qualidade e tem forte presença no mercado externo. Em geral, com variações mensais, o segmento representa cerca de 20% das exportações da cidade, movimentando valores que superam a casa dos bilhões de reais e gerando milhares de empregos.

Entretanto, o maior peso na pauta exportadora da Serra vem dos produtos da ArcelorMittal Tubarão — maior empresa instalada no município. Os itens siderúrgicos produzidos pela companhia chegam a responder por aproximadamente 70% das exportações locais e também tinham nos EUA seu principal comprador, especialmente no caso do ferro-gusa, produto que antecede o aço no processo industrial.

Mesmo antes do anúncio das tarifas, a ArcelorMittal já vinha adotando medidas para reduzir a dependência das vendas ao mercado norte-americano. Isso porque o setor siderúrgico já havia sido alvo de taxações específicas impostas pelo governo Trump.

Em janeiro, as vendas desses produtos para os Estados Unidos somaram US$ 114 milhões. No mês seguinte, fevereiro, o volume já havia caído para US$ 96,7 milhões. Apesar de uma leve recuperação em março, com US$ 97,1 milhões, os meses seguintes mantiveram o ritmo de retração: US$ 62,2 milhões em abril, US$ 61,5 milhões em maio e US$ 67,1 milhões em junho.

Pela primeira vez em muitos anos, em julho, os Estados Unidos não foram o principal destino das vendas da ArcelorMittal Tubarão. A liderança ficou com a França, que adquiriu US$ 50 milhões em produtos, enquanto os norte-americanos compraram US$ 29,8 milhões. Na sequência aparecem a Argentina, com US$ 14,8 milhões, e a Alemanha, com US$ 14,0 milhões.

Para se ter uma ideia da mudança, nos seis primeiros meses do ano a França havia comprado US$ 19 milhões em produtos siderúrgicos exportados pela Serra. Apenas em julho, esse valor saltou para US$ 50 milhões.

Essa é uma configuração totalmente nova para a pauta exportadora do município. Ainda não está claro como o mercado vai se comportar nos próximos meses, já que, no fim de julho, o governo dos Estados Unidos detalhou as tarifas de 50% anunciadas anteriormente, incluindo a lista de mais de 700 itens isentos. Parte desses produtos isentos contempla itens siderúrgicos, como o ferro-gusa — que, no entanto, já vinha sendo alvo de taxações anteriores.

Os Estados Unidos só se mantiveram como o maior destino das vendas totais da Serra em julho porque preservaram o comércio no setor de rochas, adquirindo quase US$ 30 milhões em produtos do município — parte deles incluída na lista de isenções tarifárias anunciada por Trump.

Julho foi um mês marcado por incertezas, e todas essas mudanças refletem esse cenário de dúvidas. Especialistas brasileiros têm apostado na diversificação do comércio exterior e na multilateralidade. O crescimento da participação das vendas de produtos da Serra para a Europa é um exemplo disso, já que o mercado europeu tem se mostrado mais estável diante das volatilidades das políticas tarifárias do governo Trump.

Agora, em agosto — mês em que as tarifas foram efetivamente implementadas — será possível observar um cenário mais concreto e identificar as soluções adotadas para contornar a histórica dependência do mercado norte-americano nas exportações da Serra.

Foto de Yuri Scardini

Yuri Scardini

Yuri Scardini é diretor de jornalismo do Jornal Tempo Novo e colunista do portal. À frente da coluna Mestre Álvaro, aborda temas relevantes para quem vive na Serra, com análises aprofundadas sobre política, economia e outros assuntos que impactam diretamente a vida da população local. Seu trabalho se destaca pela leitura crítica dos fatos e pelo uso de dados para embasar reflexões sobre o município e o Espírito Santo.

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