Governo quer acabar com obrigação de autoescola para carteira de motorista

CNH sem autoescola: o governo estuda acabar com obrigatoriedade de aulas para obter a carteira de mororista.
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Crédito: Divulgação

O governo federal está avaliando mudanças significativas nas regras para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Entre as propostas em discussão, está o fim da obrigatoriedade de frequentar autoescolas para quem deseja se habilitar a dirigir. A iniciativa, segundo o ministro dos Transportes, Renan Filho, busca reduzir os custos e tornar o processo de emissão da CNH mais acessível.

O plano já foi finalizado pelo Ministério dos Transportes e será encaminhado ao presidente Lula (PT) para avaliação.

Durante entrevista ao videocast C-Level Entrevista, da Folha de S.Paulo, o ministro afirmou que a proposta prevê a flexibilização das aulas obrigatórias. Com a mudança, o candidato poderá escolher outras formas de aprendizado, desde que seja aprovado nos exames teórico e prático.

“O Brasil é um dos poucos países no mundo que obriga o sujeito a fazer um número de horas-aula para fazer uma prova”, disse Renan Filho. “A autoescola vai permanecer, mas ao invés de ser obrigatória, ela pode ser facultativa.”

Atualmente, o valor para obter a CNH gira em torno de R$ 3.000 a R$ 4.000, variando conforme o estado. De acordo com o ministro, o novo modelo poderá reduzir esse custo em mais de 80%.

“É caro, trabalhoso e demorado. São coisas que impedem as pessoas de ter carteira de habilitação”, afirmou. Para ele, a proposta pode ampliar o acesso das populações mais pobres ao documento, favorecer a entrada no mercado de trabalho e impulsionar a formação de mão de obra.

Como a obrigatoriedade das aulas está prevista em resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), e não em lei, a mudança poderá ser implementada por meio de ato do Executivo, sem necessidade de aprovação do Congresso Nacional.

Conforme a proposta, continuará existindo uma regulamentação para o processo de aprendizagem, mas com menos exigências. O futuro condutor poderá definir a quantidade de aulas necessárias, escolher entre uma autoescola ou contratar um instrutor autônomo credenciado, que não precisará estar vinculado a uma empresa.

“O cidadão vai ter que passar na prova, vai ter que passar na direção, mas ele vai estudar no mundo moderno”, declarou Renan Filho. “Vai ser um programa transformador. Nós não estamos inventando roda, estamos usando a experiência internacional.”

Segundo o ministro, a medida se baseia em experiências de outros países. Na Inglaterra, por exemplo, não há exigência de curso obrigatório para tirar habilitação. Nos Estados Unidos, a maioria dos estados libera candidatos maiores de 18 anos dessa obrigatoriedade.

Questionado sobre como uma pessoa poderá aprender a dirigir fora dos cursos formais, o Ministério dos Transportes explicou que é possível realizar o treinamento em circuito fechado particular, como dentro de condomínios. Em vias públicas, porém, a legislação de trânsito segue em vigor: dirigir sem a supervisão adequada configura infração.

Outra mudança prevista é o fim da exigência de um veículo adaptado para o treinamento. Será permitido usar um carro próprio ou do instrutor. No entanto, não será autorizado que pais ensinem filhos a dirigir na rua, conforme esclareceu o ministério.

Inicialmente, as alterações devem contemplar as categorias A (motocicletas, motonetas, ciclomotores e triciclos) e B (carros de passeio, utilitários e caminhonetes).

Renan Filho afirmou que pesquisas realizadas pela pasta revelaram que, em cidades de porte médio, até 40% dos motoristas circulam sem habilitação. O custo elevado é um dos principais fatores para essa escolha.

“A habilitação custa quase o preço de uma moto usada”, destacou.

Entre as mulheres, os dados são ainda mais preocupantes: 60% das que estão em idade para obter a CNH não têm o documento.

“Na hora que a família tem o dinheiro para tirar uma carteira, normalmente, escolhem tirar a dos meninos. Isso ainda gera uma exclusão gigantesca de gênero”, pontuou. Ele acredita que isso explica a baixa presença feminina entre motoristas profissionais.

Renan também reconheceu que a proposta poderá encontrar resistência no setor de autoescolas, que movimenta cerca de R$ 12 bilhões por ano e atende de 3 a 4 milhões de candidatos à habilitação.

“Se ele não gastar esse dinheiro para tirar a carteira, isso vira o quê? Vira consumo.”

De acordo com estimativas da Feneauto (Federação Nacional das Autoescolas), mais de 15 mil autoescolas operam atualmente no país.

“As empresas vão continuar. Agora, vai permanecer quem for eficiente, quem gerar um curso que tem eficiência. Mas eu sou contra sempre que o Estado obriga o cidadão a fazer as coisas”, afirmou. “Se você achar que precisa, vai lá e faz.”

Hoje, para obter a CNH, o candidato precisa ter no mínimo 18 anos, saber ler e escrever, passar por exames médico e psicotécnico, frequentar aulas teóricas e práticas com carga horária mínima e ser aprovado nas provas do Detran. Parte do curso prático pode ser feito em simuladores.

Curso de autoescola dificultam a obtenção da carteira de motorista, diz ministro

Renan comparou o modelo atual ao acesso ao ensino superior público.

“Imagina que se a gente, para estudar numa universidade pública federal, como é a carteira de motorista, alguém dissesse assim: você só pode [entrar] se você fizer este cursinho aqui. Quanto custaria a mensalidade do cursinho?”

Ele também destacou que a complexidade e o custo do processo dificultam a formação de profissionais para setores essenciais, como o de transportes. O atraso na obtenção da primeira habilitação, segundo ele, afeta diretamente a formação de motoristas de caminhão, trator, ônibus e vans.

“O sujeito, para dirigir um caminhão, primeiro é habilitado para um veículo comum, depois ele ganha familiaridade com a direção e vai passando a dirigir veículos mais complexos. Se ele tira a primeira carteira com 30 anos, quando ele vai conseguir dirigir um caminhão inflamável?”, questionou o ministro.

O ministro fez questão de ressaltar que a proposta não terá impacto financeiro para os cofres públicos.

Foto de Gabriel Almeida

Gabriel Almeida

Jornalista há 11 anos, Gabriel Almeida é editor-chefe do Portal Tempo Novo. Atua diretamente na produção e curadoria do conteúdo, além de assinar reportagens sobre os principais acontecimentos da cidade da Serra e temas de interesse público estadual.

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