Espírito Santo precisa voltar a ter três senadores

Compartilhe:
senadores

O sistema bicameral do Poder Legislativo brasileiro foi concebido para assegurar tanto a representatividade popular quanto a institucional. Por isso, conforme previsto na Constituição, a Câmara dos Deputados representa o povo, enquanto o Senado Federal representa os estados. Cada unidade da federação possui o mesmo número de três senadores, independentemente de sua extensão territorial ou população. Trata-se de um mecanismo criado para equilibrar o poder entre as regiões do país.

É exatamente por esse motivo que o mandato de senador tem duração de oito anos: para garantir maior estabilidade e continuidade institucional no processo legislativo, que, em geral, é moroso. Um exemplo claro é o Contorno do Mestre Álvaro, que levou mais de 30 anos entre a concepção e a inauguração.

Essa estrutura é especialmente relevante para estados como o Espírito Santo que, apesar dos avanços conquistados, ainda é geográfica, populacional, política e economicamente menor em comparação a outras unidades da federação — especialmente aquelas situadas no eixo Sul-Sudeste.

No entanto, em meio à cansativa radicalização da política nacional, o Senado Federal tornou-se mais um espaço tomado por narrativas ideológicas, frequentemente desconectadas dos problemas concretos da população e comprometido mais com os grupos políticos do que com os desafios reais de seus respectivos estados.

Essa conta não fecha para o Espírito Santo — muito menos para a Serra — considerando que, historicamente, foi através do Senado que muitas das demandas mais urgentes do município conseguiram avançar. Atualmente, os representantes capixabas no Senado são Fabiano Contarato (PT) e Marcos do Val (Podemos), cujos mandatos se encerram em 2026, e Magno Malta (PL), com mandato até 2030.

É uma configuração de parlamentares alinhados a dois campos opostos da polarização política: o bolsonarismo, no caso de Do Val e Magno Malta, e o petismo, no caso de Contarato. O problema surge quando os interesses desses grupos partidários entram em choque com os interesses do Espírito Santo — o que, infelizmente, já aconteceu. Em 2013, por exemplo, o Governo Federal do PT acatou a extinção do Fundap sem estabelecer uma regra de transição impondo prejuízos bilionários ao estado. Mais recentemente, vimos bolsonaristas celebrarem a taxação sobre exportações brasileiras para os Estados Unidos — justamente o maior parceiro comercial do Espírito Santo.

senadores

Dos três senadores capixabas, Fabiano Contarato é, ainda, o que mais demonstra alguma atuação em pautas locais, sobretudo por seu perfil mais técnico e estar diretamente vinculado ao grupo político que comanda o Governo Federal.

No entanto, se há sobra de conhecimento técnico, falta habilidade política. Contarato está longe de ser um senador municipalista, que exerça o papel de ponte institucional entre Brasília e os municípios capixabas, seus deputados, vereadores e até o próprio Governo do Estado — especialmente diante das diferenças políticas que o afastam tanto de personalidade locais quanto de redutos. Na época de Gerson Camata, por exemplo, era comum ver caravanas de prefeitos do Espírito Santo indo à capital federal para destravar recursos e viabilizar avanços em áreas que, naquele período, dependiam fortemente da atuação do governo federal.

senadores

Magno Malta, que em certa medida cumpriu esse papel no passado — quando ainda não estava mergulhado nas guerras ideológicas que, à época, sequer existiam com a intensidade de hoje — e que já chegou a apoiar o PT, parece ter esquecido da importância de representar institucionalmente o Espírito Santo no Senado. O que se vê atualmente é muito mais um senador bolsonarista do que um senador capixaba.

senadores

Marcos do Val, por sua vez, nem se menciona. Não é raro vê-lo envolvido em episódios bizarros, frequentemente sendo alvo de questionamentos quanto à sua sanidade e à sua real capacidade de exercer o mandato. 

O Espírito Santo conta hoje com três senadores que, além de não atuarem de forma conjunta nas pautas fundamentais do estado, também não demonstram trabalhar em sinergia com o Governo Estadual na busca por soluções aos seus desafios históricos. Há décadas o estado enfrenta entraves na esfera federal, especialmente em questões estruturantes como investimentos em portos, ferrovias e rodovias. Além disso, temas de grande impacto, como a Reforma Tributária, seguem envoltos em incertezas, sem uma articulação clara por parte da bancada capixaba no Senado que permita antecipar e mitigar seus efeitos sobre a economia local.

O Espírito Santo precisa voltar a ter três senadores da República que, independentemente de serem bolsonaristas ou petistas — conforme a escolha democrática da população —, ao menos dialoguem entre si e com o Estado que representam;  e que atuem de forma articulada, especialmente por se tratar de uma Casa Legislativa onde todos os estados possuem o mesmo peso político. Os interesses do Espírito Santo devem estar acima das disputas ideológicas nacionais. O povo capixaba não pode continuar sendo penalizado por um Senado mais engajado em embates partidários distantes da realidade local do que nas demandas concretas da população que deveria representar.

Foto de Yuri Scardini

Yuri Scardini

Yuri Scardini é diretor de jornalismo do Jornal Tempo Novo e colunista do portal. À frente da coluna Mestre Álvaro, aborda temas relevantes para quem vive na Serra, com análises aprofundadas sobre política, economia e outros assuntos que impactam diretamente a vida da população local. Seu trabalho se destaca pela leitura crítica dos fatos e pelo uso de dados para embasar reflexões sobre o município e o Espírito Santo.

Leia também