O governador Renato Casagrande anunciou ontem (06), em solenidade alusiva ao Dia Mundial do Meio Ambiente celebrado domingo (05), que o Espírito Santo receberá 372 milhões investimentos para a recuperação florestal. Tudo isso em meio à ‘epidemia’ de desmatamento da Mata Atlântica, que teve expressiva alta nos últimos anos.
Dos investimentos em reflorestamento, R$ 25 milhões sairão dos cofres do Governo. O restante, R$ 347 milhões, virão de compensação pelo desastre/crime ambiental da Samarco (Vale + BHP), que derramou lama tóxica da mineração no rio Doce e no oceano Atlântico. Rejeito que se espalhou no mar entre o litoral do ES, o sul da Bahia e o norte fluminense.
No caso dos R$ 25 milhões do caixa estadual, serão para promover projetos de agrofloresta e obras físicas para melhorar a absorção da chuva no solo. Inclui também a construção de pequenas barragens. A previsão é que sejam aplicados em três anos. A iniciativa foi batizada de projeto Floresta + Produtiva. Começará por localidades rurais dos 12 municípios da região do Caparaó, com a criação dos chamados Núcleos de Produção Florestal Sustentável (NPFS). Segundo o Governo, será expandido posteriormente.
Já o dinheiro da compensação pela lama tóxica da extração de minério de ferro, R$ 347 milhões, será operado pela Fundação Renova. Instituição criada pelas donas da Samarco, as gigantes multinacionais da mineração Vale e BHP Billiton, responsáveis por passivos ambientais imensos ao redor do planeta.
Lama da Samarco (Vale + BHP Billiton) e ajuda para reflorestamento
Segundo o Governo, o dinheiro das mineradoras vai bancar a recuperação aproximada de 11, 7 mil hectares de florestas e cerca de 1, 5 mil nascentes. Editais serão lançados para chamar os proprietários rurais interessados em participar. Além disso, o governo acrescentou que as mineradoras também bancaram para a Defesa Civil Estadual um caminhão, duas viaturas, drones, computadores e outros equipamentos totalizando valor de R$ 1,9 milhão.
É bom lembrar que a lama da Samarco inviabilizou o abastecimento de água do rio Doce nos municípios capixabas de Baixo Guandu, Linhares e Colatina. Os dois primeiros tinham alternativas e passaram a captar o líquido em outros mananciais. O terceiro, teve que voltar a captar água no rio Doce contaminado com metais pesados cancerígenos decorrentes da lama.
Servidores municipais e licenciamento ambiental
Na solenidade também foram apresentados resultados referentes ao incentivo de servidores de municípios habilitados a dar licença ambiental, através de programa estadual de adesão voluntária criado ano passado.
Na prática, o programa dá prêmio em dinheiro aos servidores que cumprirem metas pré-estabelecidas pelo programa na emissão de licenciamentos. Na solenidade o secretário de Meio Ambiente do Estado, Fabrício Machado, defendeu que o programa também fortalece a fiscalização e a educação ambiental. Hoje, dos 78 municípios, 51 dão licenças ambientais.
Recentemente a reportagem de Tempo Novo flagrou situações de degradação ambiental em Domingos Martins e Santa Teresa, inclusive com derrubada de Mata Atlântica e degradação de nascentes – que por lei são Áreas de Preservação Permanente, em (APP) em empreendimentos licenciados pelas secretarias de meio ambiente daqueles municípios e autorização de supressão vegetal emitidas pelos Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do ES (Idaf).
Vale lembrar de que de Santa Teresa e Domingos Martins descem os rios que abastecem a Grande Vitória, incluindo aí a Serra.
Monitoramento, aceleração de licenças, resíduos sólidos e energia solar
Também foram anunciadas no pacotão o desenvolvimento de novas ferramentas tecnológicas para gestão ambiental. Uma delas é a plataforma GEOIEMA que, segundo o governo, ajuda na fiscalização e dá mais transparência com a disponibilização de dados e informações geoespaciais para consulta, interação e download. E pode ser acessada no endereço http://geo.iema.es.gov.br/.
Também foi anunciada nova plataforma para rastrear o transporte de resíduos sólidos em território capixaba, com a criação do do Sistema Estadual On-line de Manifesto de Transporte de Resíduos Sólidos (Sistema MTR-ES). E ainda também foram anunciadas medidas para acelerar e desburocratizar licenciamentos no ES, além de novas regras para a liberação de projetos de geração de energia solar.
Água, esgoto e Serra
No pacotão dos anúncios, também foram apresentados investimentos em água e esgoto. Serão R$ 116 milhões, segundo o presidente da Cesan, Carlos Aurélio Linhalis, o Cael.
Desse investimento, haverá a ampliação da capacidade da produção na Estação de Tratamento de Água (ETA) de Carapina. Localizada entre Jardim Limoeiro e Valparaíso, a ETA usa água do rio Santa Maria da Vitória, manancial que nas últimas décadas vem dando sinais de esgotamento. Exemplo foi o ‘apagão’ hídrico ocorrido em alguns momentos da superseca que atingiu o ES em 2015 e 2016.
A ETA abastece a maior parte da Serra. E ainda atende a zona norte de Vitória e Praia Grande, em Fundão. Também fornece água para o Complexo de Tubarão (Vale e ArcelorMittal), maior consumidor individual do manancial.
Estação de Esgoto de Manguinhos
Também foi anunciado, por dentro do pacote de saneamento, ampliação da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Manguinhos. Curioso é o fato do Estado ter que gastar neste projeto, uma vez que o esgoto da Serra está sob a gestão da Parceria Público Privada (PPP) Cesan / Ambiental Serra, sendo esta última responsável por fazer os investimentos para a ampliação dos serviços na cidade. Como contrapartida a Ambiental Serra, que pertence ao grupo Aegea, recebe o dinheiro arrecadado pela Cesan na taxa de esgoto cobrada do consumidor casada com a conta de água.
Vale lembra que a PPP existe desde janeiro de 2015. E que recentemente o Tribunal de Contas do Estado e a CPI do Esgoto na Câmara da Serra encontraram deficiências na prestação do serviço. Inclusive na ETE Manguinhos.
A parte de sanemento do pacotão também prevê investimento de água e esgoto em Guarapari e Conceição da Barra.
Melhorias nas sedes de parques e centralização dos órgãos ambientais
E teve mais no pacotão. O governo anunciou ampliação e reforma das sedes adminstrativas de dois famosos parques estaduais: o da Pedra Azul, em Domingos Martins, e o da Cachoeira da Fumaça, em Alegre. Somados, os investimentos nos dois será de R$ 9 milhões.
Não acabou. O Governo infomou que pretende colocar todos os órgãos relacionados ao meio ambiente, no local onde hoje funcional o Iema (Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos), em Cariacica.
Vale onipresente
O imóvel e o terreno onde funciona atualmente o Iema foi doado ao estado pela Vale no início dos anos 2000, empresa que tem um dos maiores passivos ambientais em território capixaba, incluindo o conhecido pó preto que prejudica a saúde respiratória do morador da Grande Vitória.
O próprio presidente do Iema, o engenheiro Alaimar Fuizza, foi funcionário da Vale por 30 anos, onde chegou a ser diretor. Saiu da mineradora para assumir o órgão estadual responsável por licenciamento e fiscalização ambiental, inclusive do Complexo de Tubarão. O Iema também é quem cuida de monitorar a qualidade do ar na Grande Vitória.
Governo reage à devastação nas montanhas com operação da Polícia
Um dos fatores que tem gerado alta do desmatamento da Mata Atlântica é a corrida imobiliária de parcelamento de áreas rurais nas montanhas para implantação de sítios, chácaras, loteamentos e condomínios.
Para se ter uma dimensão do problema, entre os biênios de 2018/2019 e 2019/2020 o crescimento da destruição foi de 460%. E entre os biênios 2019/2020 e 2020/2021 o viés de alta se manteve, com avanço de 7% na devastação. Ao todo, a mata Atlântica no ES perdeu 155 hectares de 2018 a 2021. Isso numa foresta que já cobriu todo o Estado e hoje só está de pé em pouco mais de 10% do território.
Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em parceria com a ong SOS Mata Atlântica, que também apontaram alta expressiva, no período citado, em quase todos os demais estados do país que possuem o bioma.
E apesar do Governo capixaba autorizar, através do Idaf, cortes em florestas em estágio inicial de regeneração – o que a lei permite, já há reações. Uma delas foi a operação Curupira, deflagrada em maio pela Polícia Militar Ambiental e pelo próprio Idaf para combater os desmates considerados ilegais.
A operação surgiu após a repercussão de reportagens sobre a destruição ligada ao mercado imobiliário em Santa Teresa, Domingos Martins, Marechal Floriano e outras cidades vizinhas nas montanhas.
O próprio governador, em declaração à reportagem na última sexta-feira (03), garantiu que a operação Curipira irá continuar em Santa Teresa, município onde a degradação está afetando nascentes de rios importantes, dentre eles o Reis Magos, que abastece a Serra.
Esforço para zerar destruição da Mata Atlântica
Casagrande voltou a tocar no tema na solenidade desta segunda – feira (05) e elogiou a atuação da Polícia. “Destaco a Polícia Militar Ambiental que nos auxilia no esforço para chegarmos ao desmatamento zero no Espírito Santo”, disse.
A sociedade civil tem reagido também. Ativistas e moradores de Domingos Martins estão fazendo abaixo assinado on line para pedir providências contra o desmatamento e a expansão desordenada do mercado de sítios, chácaras e condomínios nas áreas rurais.
Além disso, espalharam outdoors pela Grande Vitória e nas montanhas alertando para o aumento da destruição da Mata Atlântica.