Política

Aos 96 anos, morre João Trindade, um dos serranos mais ilustres: perseguido, torturado e exilado

João Trindade tinha 98 anos. Foto: Divulgação

O movimento popular da Serra está de luto. Morreu neste domingo (21), o ex-presidente e fundador da Federação das Associações de Moradores da Serra (Fams), João Trindade, aos 96 anos. Ele foi uma das vozes da Serra mais ativas contra a ditadura militar. Perseguido, torturado e exilado, João Trindade teve uma vida dedicada na luta por avanços sociais.

João já estava acamado há dois anos, lutando contra um câncer de próstata. Ele teve complicações e veio a óbito. Ele partiu deixando seis filhos, um in memorian, 15 netos e 16 bisnetos.

A reportagem do TEMPO NOVO conversou com Aurélio Carlos, líder histórico do movimento popular, que ao lado de João Trindade percorreu a Serra dos anos 80 e 90 na luta pela participação popular na sociedade.

Natural de Pernambuco, João nasceu no dia 01/01/1925, e desde muito cedo se envolveu com lutas populares. Foi na cidade de Igarassu – PE, distante 1,8 mil km da Serra, que João começou sua trajetória nos idos da década de 30. Membro do sindicato dos canavieiros, ele encampou movimentos formados pelos trabalhadores por melhorias nas condições de trabalho das usinas de açúcar naquele Estado. Chegou a ser candidato a vereador na década de 40. Na época, o Brasil vivia as instabilidades que marcaram o fim da era Vargas.

Foi através da militância política que acabou conhecendo Luis Carlos Prestes, ao lado de quem participou de lutas históricas. Durante o golpe militar de 1964, João esteve entre os nomes riscados da lista dos militares. Foi perseguido, torturado e exilado. Precisou fugir de Pernambuco. E é aí que sua história com a Serra começa.

Logo no início do regime ditatorial, João chegou ao Espírito Santo, e teve que trocar de nome. Aurélio Carlos contou que a família de João também sofreu perseguição. De acordo com ele, durante a fuga de Pernambuco, a esposa de João, então grávida, teve uma arma apontada por militares que buscavam informações do paradeiro de João.

Vivendo uma vida de luta clandestina contra o autoritarismo, ele conseguiu trazer a família para o ES pouco tempo depois. Morador da Serra, João Trindade vendia milho para sustentar a família. Seu ponto de venda era na antiga região de Carapeba, atual Novo Horizonte. Antes da chegada da CST – atual ArcelorMittal – essa região era famosa pelo corredor de motéis e casas de entretenimento masculinas.

A criação de Novo Horizonte como uma bairro residencial teve a participação direta de João Trindade. “Ele foi uma das pessoas que construiu Novo Horizonte. Encampou lutas que trouxe a oferta de água encanada para o bairro, fundou a associação de moradores de lá e sempre buscou melhorias para os moradores”, diz Aurélio.

E completa: “Já em 1981 fundamos várias associações em diversos bairros, até que poucos anos depois criamos a Fams (Federação das Associações de Moradores da Serra). Foi pioneira no estado, era a forma que tínhamos para brigar em favor da democracia. Juntamos muitas forças progressistas que estavam cansados do governo militar. João não tinha medo, mesmo com aquele jeito simples dele, João tinha uma sabedoria muito grande e conseguia envolver as pessoas nas lutar sociais”.

Aurélio também lembra que um dos legados que João Trindade deixará para a Serra é a Lei do Orçamento Participativo. De acordo com ele, João fui um dos idealizadores dessa importante ferramenta popular.

“O ex-prefeito Motta sancionou e depois Vidigal implantou. Mas a ideia é nossa. Eu considero uma das lei mais importantes daquilo que podemos chamar de governo democrático. Infelizmente hoje em dia ‘avacalharam’… os prefeitos só cumprem o que eles querem, muitas lideranças ‘copitadas’. No passado não tinha isso, tinha dialogo sim, se tivesse que brigar a gente brigava, e João estava na linha de frente. Tinha independência…”, finaliza Aurélio.

Nas redes sociais, autoridades políticas lamentaram a morte de João Trindade. Entre elas, o prefeito Sérgio Vidigal (PDT). “Infelizmente perdemos hoje João Trindade. Militante na nossa cidade, ele foi um dos fundadores da Federação das Associações de Moradores da Serra no início dos anos 80. Com certeza deixou seu legado e sua contribuição para o desenvolvimento do nosso município. Meus sentimentos aos amigos e familiares”.

Velório:

O velório está acontecendo nesta segunda-feira (22), desde as 8 da manhã, na 1ª Igreja Assembleia de Deus em Cidade Continental.

Endereço: Av. Kmer, 281 – Cidade Continental-Setor ASIA, Serra – ES.

Sepultamento:

Cemitério de Carapina, às 16:00 horas.

Mari Nascimento

Mari Nascimento é repórter do Tempo Novo há 18 anos. Atualmente, a jornalista escreve para diversas editorias do portal, principalmente para a de Política.

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